Por que não consigo esquecer Valiant? Tammy se sentia totalmente enojada com a falta de controle sobre seus pensamentos enquanto alinhava o taco para atingir a bola branca. Olhou para a vermelha e para a caçapa. Música alta tocava ao fundo. Alguém estava com vontade de ouvir um rock das antigas. Um suspiro soou próximo dela.
— Dê logo a tacada, Tam. Sabe que vai ganhar de mim de qualquer jeito.
Ela virou a cabeça para sorrir para o seu melhor amigo de longa data, Tim. Os dois se conheciam desde o ensino fundamental e eram próximos de verdade. Ele tinha desejado mais do que amizade no ensino médio, mas Tammy não correspondeu seus sentimentos românticos. Agora, anos depois, eles pareciam ter uma amizade confortável, mas estritamente platônica com a qual ambos estavam felizes.
— Não posso evitar ser melhor do que você nisso.
Um sorriso curvou os lábios dele. Ele aparentava ser meio desajeitado, mas tinha um sorriso doce e olhos castanhos suaves. Tim parecia com um geek porque era um. Usava blusa estampada e calça de moletom e trabalhava em casa como programador desenvolvendo softwares de jogos. Seus olhos brilhavam com as luzes do bar.
— Posso te vencer no videogame na boa.
— Sim, pode. — Ela deu a tacada e afundou a bola vermelha na caçapa do canto. — É por isso que sou mais inteligente que você e porque estamos neste bar ao invés de na sua casa de frente aos consoles de games. Eu queria ganhar.
Ele zombou.
— Você não é mais inteligente. Eu é que sou um cavalheiro.
Ela encaçapou outra bola.
— Que pena nunca apostarmos dinheiro quando jogamos.
— Eu ganho bem, mas não tanto assim. — Ele riu. — Você levaria todas as minhas economias em uma hora do jeito que joga sinuca. 35
Tammy piscou para ele.
— Sabe que eu preciso de um teto novo.
O sorriso de Tim sumiu quando a encarou.
— Precisa? Por que não me deixa pagar por ele?
Vacilo dos grandes. Deixou escapar sem querer. Devia saber que sua mente ainda estava distraída com a memória de um par de olhos de gato cor de ouro derretido presos a um corpo que ainda fazia o seu esquentar só de lembrar. Pensava em Valiant mil vezes por dia nas quase cinco semanas que se passaram. Sacudiu a cabeça.
— Estava brincando.
Tim não engoliu.
— Não está não. Está com vazamento de novo? Qual é, Tam? Me deixe te ajudar. Nós somos amigos. Inferno, somos praticamente da mesma família. Sei quanto você ganha e é uma mixaria. Não pôde ir para a universidade como eu fui. Tinha que cuidar da sua avó e sei que ainda está pagando as dívidas dela. Aquela casa que ela te deixou é um presente de grego. Deixe eu te pagar um telhado novo. Precisa de outros consertos? Tenho dinheiro e ele está inútil numa conta bancária. Não é como se tivesse uma namorada para torrar a minha grana.
Tammy encaçapou a bola preta. Fim de jogo. Franziu o cenho para o seu melhor amigo.
— Já tivemos essa discussão e eu não vou aceitar dinheiro seu. Obrigada do fundo do coração, mas não sou uma parasita.
— Isso é conversa fiada e você sabe disso. Nunca te acusaria disso. Foi você quem sempre teve que fazer tudo pelos outros, então deixe que a ajude dessa vez. É o que amigos e familiares fazem uns pelos outros.
— Não quero brigar.
Ela se afastou da mesa de bilhar indo até a mesa onde se sentavam. Agarrou sua cerveja, deu uma olhada no líquido dentro dela e deu um gole. Raramente bebia, mas às vezes tinha vontade. Terminou sua primeira e última cerveja da noite quando secou a garrafa. Sentia a necessidade de ficar um pouco embriagada com mais frequência depois de ter conhecido Valiant.
— Não estamos brigando. Estou tentando fazer com que você veja a razão. Eu vivo com os meus pais e não pago hipoteca. A casa já está paga. Só pago os impostos, que são irrisórios. Eu ganho muito bem e tenho todos os brinquedinhos que quero. Me deixe ajudar. Lembra quando o meu pai teve o derrame ano passado e eles mandaram aquela enfermeira de merda para casa com ele? Você apareceu e tomou conta do velho. Encontrou a mulher maravilhosa que cuida dele agora. Trocou suas fraldas durante semanas e não aceitou um centavo. Agora me deixe ajudá-la.
— Vou te dizer uma coisa. — Tammy suspirou, virando-se para encará-lo. — Você pode vir trocar as minhas fraldas se eu sofrer um derrame. Até lá, não me venha com essa de me dar dinheiro. É diferente.
Tim riu. 36
— Finalmente! Está me dando uma chance de tirar a sua calcinha.
Tammy riu e sacudiu a cabeça.
— Você é nojento.
Ele mexeu as sobrancelhas.
— Ei, isso foi o mais perto de um convite para te ver nua que já recebi.
— Isso não é verdade. — Ela colocou a garrafa vazia na lata de lixo e pegou a bolsa. Uma olhada em seu relógio mostrou que tinha acabado de dar onze horas. — Não se esqueça da vez que eu quis nadar pelada quando tínhamos dez anos. Você amarelou. Achou que uma tartaruga mordedora ia lhe abocanhar em um péssimo lugar se tirasse a cueca e nadasse na lagoa. Podia ter me visto nua.
— Isso não conta. Eu achava que todas as meninas eram nojentas naquela idade, e, além disso, você ainda não tinha nada de bom pra se ver.
Ela riu e balançou a mão.
— Nem você. Eu tenho que ir. Temos que dar um almoço amanhã na igreja e tenho que chegar as sete para ajudar com a preparação. Ashley Bless conheceu um cara aí e vai se casar. Amanhã é o almoço de noivado.
Tim estremeceu.
— Alguém vai casar com ela? Ela fez um transplante de personalidade? É a pessoa mais irritante que eu já conheci. Pobre coitado. — Ele bebeu a cerveja com gosto.
Tammy bufou.
— Não. Ela ainda é uma megera, mas convenceu esse idiota que é meio fofo escutá-la falar pelos cotovelos sobre tudo. Isso ou ela usou aquela boca enorme e fez um belo boquete nele.
Ela foi até a porta do bar, acenou e lhe soprou um beijo. Ouviu Tim se engasgar com a cerveja devido ao seu último comentário e riu ao sair do estabelecimento.
Os verões na Carolina do Norte podiam ser estranhos. Tinha feito calor durante o dia, mas o sol se pôs, trazendo uma brisa fria que soprava em volta de Tammy enquanto ia em direção ao seu carro. Olhou em volta, apreciando a noite tranquila. Crescer em uma cidade pequena sempre foi sido ótimo. Conhecia quase todo mundo e teve muita liberdade, já que sua avó era meio caduca.
Tammy foi viver com ela bem depois do seu oitavo aniversário, mas ainda se lembrava de como era morar em uma cidade grande antes disso. Amava muito mais a área rural.
— Ei. — chamou um homem. — Você é Trisha Shasta?
Ela já havia pego as chaves do carro. Virou para fitar o estranho alto que vestia jeans com uma camiseta de algodão de mangas compridas verde. Ele fechou o look com um par de botas de um marrom desbotado, estilo cowboy. Definitivamente não era alguém que vivia em uma cidade do interior. Tinha o cabelo curto e castanho e parecia estar na metade dos trinta. Ela instantaneamente ficou alerta. Foi ensinada a nunca confiar em estranhos, especialmente homens. 37
— Quem deseja saber?
O homem parou e colocou os polegares no cós da calça.
— Eu me chamo Terry Briggs. Ouvi que houve um incidente com você naquele lugar dos Novas Espécies que acabaram de abrir perto daqui.
Seu coração começou a pular. O que ele ouviu? Quem era aquele cara?
— Eu não sei do que você está falando. — mentiu. — Tenha uma boa noite. — Destravou o carro, mas manteve o olhar nele. Cenários assustadores começaram a surgir em sua mente e ela teve vontade de grunhir. Um terapeuta teria um dia cheio com o amor que ela sentia pensando demais sobre todas as coisas.
— Não faça isso. — exigiu ele ao se aproximar mais um passo. — Ouvimos que você se encontrou com um daqueles animais e que ele colocou as patas em você.
Tammy ficou tensa e o medo desceu pela sua espinha. Ele estava a mais ou menos meio metro dela agora. Era alto, mais ou menos um e oitenta, mas aquilo não era novidade. Normalmente todos eram mais altos do que ela, mas ele era um estranho e sentia-se ameaçada. Olhou-o com raiva e não gostou que tivesse invadido seu espaço. Não podia abrir a porta do carro a não ser que se aproximasse mais ainda dele, o que não estava prestes a fazer.
— Escute — olhou para suas botas e de volta ao seu rosto. — cowboy. Eu não sei do que está falando. O que quer que tenha ouvido, esse boato é mentira. Agora precisa se afastar porque quero ir embora.
Uma expressão de nojo cruzou o rosto dele. Isso tornou suas feições feias e hostis.
— Eles fizeram uma lavagem cerebral em você, não fizeram? Aqueles animais fazem isso com algumas pessoas. Tudo bem, moça. Já fizeram isso antes e você não está sozinha. Precisa vir conosco para que a ajudemos a pensar com clareza outra vez. Queremos que dê uma entrevista e que diga a todos o que aqueles animais bastardos e doentes fizeram com você. Isso vai mostrar ao mundo que eles não são algo que deveria viver ao lado de pessoas decentes como nós. Todos eles precisam ser eliminados.
Ouviu tudo o que ele disse. Seu ódio óbvio pelos Novas Espécies a chocou um pouco, mas o mais alarmante do seu pequeno discurso foi a parte do “nós”. Virou a cabeça, e com toda certeza, avistou mais três homens se aproximando dela, vindos das sombras do lugar onde tinham se escondido. Nada bom. Merda. Deu uma olhada no mais alto enquanto seu coração acelerava de medo. Pense. Não entre em pânico.
— Certo. Você conseguiu. Por que não me segue até em casa e discutimos isso lá? — Podia dirigir até a delegacia se conseguisse entrar no carro ou pôr as mãos no celular para pedir socorro. Não tinha nenhuma intenção de permitir que a seguissem até em casa.
Ele piscou e pareceu um pouco surpreso, mas endureceu a boca.
— Vamos na minha caminhonete.
Ela assentiu, verificando rapidamente que precisava baixar a guarda dele. Seria mais fácil surpreendê-lo se ele achasse que era uma completa idiota. 38
— Ok! E o meu carro? Não posso deixá-lo aqui. Sam, o proprietário do bar, vai chamar o reboque assim que amanhecer se for deixado estacionado aqui. Eu dirijo e você pode me seguir.
Uma mão voou para segurar o braço de Tammy.
— Seu carro é a última coisa com que nos preocupamos. Você vai nos ajudar a colocar todo mundo contra aqueles animais.
Tammy agarrou as chaves para forçar que alguma delas passasse entre seus dedos. Quatro homens contra ela não lhe dava muita chance. Rezou silenciosamente que alguém saísse do bar para ajudá-la, mas isso não aconteceu. Agarrou a maçaneta da porta com a outra mão.
— Não posso deixar o meu carro aqui. Estou disposta a ouvir o que tem a dizer, mas não posso pagar a multa para pegá-lo de volta.
O otário de repente tentou puxá-la para longe do carro. Ela segurou na maçaneta, e ele a puxou com força suficiente para que abrisse levemente a porta, e as luzes do interior do veículo acenderam. Ele puxou com mais força e o metal que ela segurava deslizou pelos seus dedos. Ela se virou e sabia que teria que atacar para poder se soltar.
Socou o cara com força na barriga com a mão que segurava as chaves e pisou no pé dele. Sua mão doeu por causa das chaves quando o atingiu e ela rasgou o rosto dele com a outra mão. Suas unhas se enterraram na pele bem debaixo do olho. Ele berrou e a soltou bem na hora que Tammy deu um grito ensurdecedor para tentar atrair atenção para sua situação.
Tammy o empurrou e começou a correr para o bar, mas só andou alguns passos antes que alguém agarrasse seu cabelo. Gritou outra vez pela dor que atingiu a parte de trás da sua cabeça. O estranho a puxou com força e a arremessou numa caminhonete estacionada próximo. O espelho retrovisor do veículo bateu na sua bochecha e a dor explodiu perto da sua orelha.
Ele soltou seu cabelo para que os braços fortes a agarrassem em volta da cintura e evitassem que caísse no chão quando seus joelhos ameaçaram ceder. Ela gritou de novo e chutou o imbecil que a levantou do chão. A parte de trás da sua cabeça entrou em contato com um rosto quando ela se jogou para trás numa tentativa desesperada de força-lo a soltá-la. Ele disse um palavrão bem alto e a soltou.
Voltou a pôr os pés no chão e quase caiu de joelhos, mas ao invés disso, conseguiu avançar alguns passos. Dois dos seus agressores tinham se colocado entre ela e o bar. Lutou contra uma onda de tontura devido a dor em seu rosto e detrás da cabeça onde deu uma cabeçada no otário. Bateu na caminhonete outra vez, usou-a de impulso e correu na direção da estrada. Conseguiu sair do estacionamento até a calçada, para o asfalto, e avistou faróis vindo em sua direção.
Tammy correu naquele sentido, certa que os imbecis correriam no sentido oposto. O tráfego normalmente era fraco àquela hora da noite, mas quem quer que dirigisse o carro que se aproximava tinha que ser melhor do que aqueles caras. Ela balançou os braços, gritando para conseguir a atenção do motorista, e percebeu que o veículo diminuía a velocidade. 39
Reconheceu o carro quando se aproximou. O carro velho e batido do Pastor Thomas era uma visão apreciada quando ele pisou no freio completamente, parando a um metro de onde ela estava. Não podia deixar de ver o choque em suas feições enquanto a olhava através do para-brisa. O alívio a encheu até que seu olhar saiu dela, seus lábios se abriram e seus olhos se arregalaram em alarme por algo que via ao seu lado.
Tammy virou a cabeça para olhar por cima do ombro e viu os quatro homens correrem até ela. O cara com botas de cowboy que a tirou do chão tinha sangue escorrendo pelo queixo do lábio que ela havia partido e isso foi tudo o que viu antes que a alcançassem.
Tammy gritou, chutou e tentou esmurrar, mas os homens agarraram os seus braços e um deles agarrou suas pernas. Eles a tiraram do chão e correram carregando seu corpo na direção do estacionamento do bar. Uma buzina alta soou quando o Pastor Thomas gritou seu nome.
Eles a suspenderam e jogaram na caçamba da caminhonete como se fosse um saco de batatas. A força do impacto tirou o ar dos seus pulmões e a dor explodiu atrás da sua cabeça que havia batido com força no metal da caçamba. Ofegou atrás de ar, ordenou seu corpo a se mover, mas no segundo que tentou sentar, dois corpos a esmagaram.
Lutou e arranhou os dois homens, mas eles a mantiveram presa debaixo deles com facilidade. O motor da caminhonete ganhou vida e portas bateram um segundo antes da marcha ré ser engatada. Rodas giraram e tudo se movia rapidamente.
O movimento repentino e abrupto da caminhonete tirou os dois homens de cima dela quando foram esmagados de um dos lados da caçamba. Isso fez com que Tammy ficasse de lado. Ela avistou o céu escuro. Frearam o carro e ela rolou em uma nova direção um segundo antes do motorista trocar outra vez a marcha. A caixa de marcha protestou sonoramente quando rangeu.
Tammy estendeu o braço para a lateral da caçamba na esperança de passar por cima, mas o motorista acelerou antes que seus dedos a alcançassem. No momento que a caminhonete acelerou Tammy deslizou pela porta fechada. Mãos lhe agarraram e dois corpos voltaram a sentar em cima dela, prendendo-a. Ela conseguiu gritar.
O carro acelerou bastante, mas acima do motor barulhento e da respiração ofegante dos seus sequestradores, ouvia uma buzina tocar repetidamente atrás deles. Pastor Thomas seguia a caminhonete e se recusava a parar tentando chamar atenção para o que estava acontecendo.
Abençoado seja! Infelizmente, isso deixou o motorista da caminhonete ainda mais descuidado. O carro passava por cima de buracos e Tammy grunhiu em agonia quando os homens em cima dela a esmagaram com mais força contra o doloroso metal às suas costas.
Suas costelas e cabeça doíam. Também lutava para respirar com o peso combinado dos dois comprimindo seus pulmões. A buzina continuava apitando atrás deles e aquilo parecia não ter fim. Os homens que a seguravam praguejaram quando o passeio ficou bem difícil depois do motorista parecer ter deixado a pista, dirigindo sobre o que Tammy suspeitava ser grama pelo modo em que podia sentir a traseira do veículo saltando e se movendo violentamente. O som da buzina ficou mais fraco. Ela percebeu que seus agressores eram espertos o bastante para saírem da estrada já que o carro do pastor não conseguiria fazer o mesmo. 40
Tammy quase desmaiou da dor quando um barulho enorme de algo sendo triturado saiu da caminhonete e ela diminuiu a velocidade até parar. Um homem gritava palavrões de dentro da cabine. Os homens que a seguravam saíram de cima dela. Bateu em um deles com o joelho, bem no estômago. Ele fez um som horrível como que fosse vomitar e ela rasgou com as unhas o braço do outro que tentava agarrar sua coxa. As unhas se enterraram na pele macia até ele gritar, saindo de perto.
Tammy lutou com pernas e punhos para escapar dos sequestradores. Conseguiu provocar danos suficientes para que se afastassem. Sentou e se arremessou na direção contrária. Agarrou a lateral da caçamba.
O desespero e o terror fizeram com que encontrasse forças para suspender o corpo e cair do lado da caminhonete, caindo na terra. Ficou deitada ali por um segundo, com dor, mas conseguiu se levantar quando a porta da cabine próxima a ela se abriu.
Foi capaz de ver a floresta densa que a cercava com a ajuda da lua. Correu para a linha escura de árvores esperando que pudesse se esconder lá, e sabia que aquela seria sua única chance de escapar dos bastardos. Quase chegou até as árvores quando os ouviu gritando com ela. Isso a encorajou a correr mais rápido e o medo a motivou a dar tudo de si, ignorando a dor na lateral de seu corpo.
Alguém ofegava fortemente atrás dela, fechando a distância, e a vontade de gritar a envolveu com força. Estavam ganhando dela. Desviou de uma forma escura e esperou que eles não a vissem e batessem nela. Ao invés disso, alguma coisa atingiu as suas costas. Fez com que caísse no solo cheio de folhas e um grande e doloroso peso a prendia ao chão. A dor a rasgou com uma intensidade que fez com que tudo se apagasse.
* * * * *
— Valiant? — gritou Tiger novamente.
Valiant saiu de sua casa, se aproximou do portão e parou. Olhou seu amigo com raiva. — Há alguma razão para estar berrando meu nome às duas da manhã? Eu estava dormindo.
Tiger tinha uma cara séria.
— Recebemos uma ligação há alguns minutos do xerife local. Eles precisam da nossa ajuda.
Valiant estreitou os olhos com raiva.
— Você sabe que humanos não são as minhas pessoas favoritas. Vá ajudá-los se assim deseja. Por que está me incomodando?
Tiger mordeu o lábio.
— Precisa ficar calmo, certo?
As tripas de Valiant apertaram. Tiger só falaria isso se o que quer que fosse dizer fosse deixá-lo irado. 41
— Por quê? Tem mais humanos planejando nos atacar? Precisa que eu vigie a Zona Selvagem? Eles passaram pelo muro? Não vou vigiar lá fora junto com os seguranças humanos. Eu mato os invasores se aparecerem aqui.
Tiger hesitou.
— Uma mulher humana foi sequestrada da cidade e há uma testemunha. O cara que a viu ser levada seguiu a caminhonete, mas a perdeu quando ela entrou na floresta onde seu carro não podia entrar. Ele usou o celular para pedir socorro, mas a cidade é pequena. Levou alguns minutos para os policiais chegarem onde ele os perdeu. Eles encontraram a caminhonete, mas não encontraram a mulher. Quatro homens a levaram e fugiram para dentro da floresta. A polícia local não tem acesso a cães farejadores. Eles teriam que esperar até amanhecer e pode ser tarde demais para ela. O xerife pensou em nós. Alguns dos nossos oficiais estão indo para lá comigo para ajudar e eu achei que você queria vir conosco.
Valiant odiava a ideia de qualquer mulher à mercê de machos humanos. Eles eram instáveis e cruéis.
— Sinto muito por essa fêmea, mas ainda não entendo porque você veio aqui. Está perdendo tempo falando comigo se pretende ir atrás dela. Já deveria ter ido.
— Para piorar as coisas, quando o xerife e os seus homens acharam a caminhonete, vasculharam o carro, procurando identificar o dono. Eles perceberam que esses caras são membros de grupos extremistas anti-Novas Espécies. Eles tinham uns panfletos dentro do carro que apontam para essa conclusão. — Tiger hesitou. — Eles pegaram Tammy.
O choque rasgou Valiant.
— Minha Tammy?
Tiger assentiu sério.
— É. Sua Tammy. Achei que quisesse ajudar a encontrá-la. — fez uma pausa. — Achei que ainda se lembraria do cheiro dela o suficiente para poder encontrá-la mais rápido.
Um rugido emergiu de Valiant. Raiva o envolvia ao pensar em machos atacando sua Tammy. Grupos de Ódio matavam os humanos que se associavam com Espécies. O rosto lindo dela surgiu em sua mente de maneira instantânea. Ele ofegava, ficando um pouco louco com a ideia do que fariam com ela e lutou para pensar.
Tiger estremeceu.
— Devo entender que vai então?
Valiant girou e olhou para sua casa.
— Me deixe pegar algumas coisas. — rosnou alto. — Não vá sem mim. Vou rasgar esses homens com as minhas próprias mãos se eles a tiverem machucado de alguma forma.
— Foi o que eu pensei! — gritou Tiger.
Valiant saiu às pressas da casa uns minutos depois. Tiger notou os sapatos que ele colocou e deu uma olhada em sua coxa. Não disse uma palavra sobre a faca assustadora presa nela, ao invés disso entrou no Jipe. Valiant subiu no banco do passageiro. Tiger acenou com a mão para os outros dois veículos atrás deles para que os seguissem.
— Eu vou matá-los se eles a machucarem. — jurou Valiant. 42
Tiger mordeu o lábio.
— Lembre-se, não estaremos na Reserva. A lei deles pode ver um problema nisso, mas eles realmente sequestraram uma mulher. Tenha em mente que a lei deles será severa quando nós os capturarmos. Quero garantir que entenda isso. Não poderia machucá-los um pouco e deixar que vivam? Seria uma péssima publicidade devolver esses humanos em pedaços para a polícia deles.
Valiant urrou.
— Depende se a machucaram ou não.
— Isso me parece justo. — Tiger pisou fundo.
* * * * *
O grisalho Xerife Cooper, que parecia estar na metade dos cinquenta, olhava de boca aberta sem disfarçar para os quatro Novas Espécies que saíram dos três Jipes. Tiger disse a Valiant o nome do humano no caminho até lá e o advertiu para que tentasse ser educado. Valiant tinha rosnado.
Só queria encontrar Tammy. Não dava a mínima sobre as impressões que fariam ou se Justice queria que fosse gentil. Tiger parecia pensar que era algo grandioso os humanos terem pedido a ajuda deles, mas Valiant sabia que estavam bastante desesperados para a solicitarem.
Passou o olhar pelos outros três Espécies. Tiger, Brass e Rider estavam com seus uniformes. O xerife parecia se fixar mais em Valiant e o medo arregalava os olhos do humano. Podia ser porque não usava uniforme, vestindo um jeans e um suéter cinza que colocou quando a presença de Tiger o acordou. Encontrou o olhar direto do xerife e percebeu que o homem parecia incapaz de desviar os olhos de seu rosto. Resistiu a vontade de mostrar os dentes para de fato armar um show. Obviamente, não era o jeans que deixava o cara tão desconfortável, e sim suas feições.
O humano pareceu controlar o medo e se aproximou deles quando se adiantaram. Ele limpou a garganta e estendeu a mão para Tiger, que tinha ido na frente para se encontrar com o grupo de humanos aguardando no acostamento.
— Eu sou o Xerife Greg Cooper e esses são os meus oficiais. Obrigado por virem. Chegaram bem rápido e agradecemos isso.
Tiger parou perto do humano e apertou sua mão.
— Eu sou Tiger. Esses são os meus homens. — Ele soltou a mão do homem para indicar. — Aquele é Brass, Rider e Valiant. Estamos felizes por ajudar, Xerife Cooper. Alguma coisa mudou desde que nos ligou?
Xerife Cooper sacudiu a cabeça.
— Não. Eu não sei com isso pôde acontecer. Conheço Tammy Shasta desde que se mudou para cá quando tinha apenas oito anos e não conheço ninguém que iria querer machucá-la. Ela é uma garotinha muito gentil. Foi o nosso pastor que testemunhou aqueles homens a raptarem e ele os seguiu por aqui. A caminhonete que usaram para levá-la 43
quebrou a uma milha da estrada. Eles arrancaram o cárter do óleo e o motor prendeu. Eles são estranhos nessa área porque o Pastor Thomas conhece todo mundo que vive por aqui e ele não conseguiu reconhecê-los.
Tiger assentiu.
— Vamos assumir daqui. Você são mais do que bem-vindos a virem conosco se quiserem. Podemos rastrear qualquer coisa com dois gatos e dois caninos.
— Eu insisto em ir. — declarou o xerife quando deu a todos eles um olhar nervoso, parecendo incerto a respeito de não estar presente para observar o que quer que fizessem. — Já vi muitas coisas na minha vida e quando encontrarmos Tammy, tenho um pressentimento de que, se ainda estiver viva, possa querer ver um rosto conhecido. Não posso pensar nos motivos para que quatro homens levem uma moça bonita que não sejam os piores possíveis. Tenho uma ambulância de prontidão se não a tiverem estuprado e matado logo em seguida. — Ele fez uma pausa, franzindo o cenho. — Dois gatos e dois caninos?
Valiant rosnou e assustou todos os humanos ao seu redor que recuaram com medo, os olhos presos nele. Se algum dos humanos tivesse colocado as mãos em Tammy com intenções sexuais ele arrancaria os seus dedos. Arrancaria seus braços das juntas enquanto gritavam e então começaria a surrá-los com seus próprios membros. Ele...
Tiger falou, encerrando suas maquinações violentas. Deu um olhar de advertência para Valiant, transmitindo silenciosamente que precisava controlar sua raiva.
— Valiant e eu somos espécies felinos enquanto Brass e Rider são caninos.
— Oh. — O xerife parecia não saber o que dizer.
A irritação de Valiant não podia ser contida. Tiger queria bancar o educado com os humanos, mas ele só queria ouvir o que o xerife sabia que fosse lhe ajudar a encontrar Tammy. Odiava perder tempo. Levantou os lábios para mostrar as presas a Tiger, transmitindo uma mensagem própria. Não era paciente e aquele papo furado tinha que terminar. Um ofego dos humanos fez com que olhasse com raiva para o Xerife Cooper, que tropeçou para trás, a expressão horrorizada, fitando sua boca.
— Isso são…
— Dentes. — confirmou Tiger. — Não se preocupe com Valiant. Ele só está com muita raiva pela mulher ter sido levada e quer ir atrás dela agora.
O xerife finalmente olhou para Tiger.
— Eu mandei uma pessoa até o carro dela no bar de onde ela foi levada para ver se podia encontrar algo dela que tivesse seu cheiro. Eu sei que quando usamos cães farejadores eles precisam de algo da vítima. Meu oficial deve voltar a qualquer momento. Ele disse pelo rádio que está com a jaqueta dela.
Tiger apontou para Valiant.
— Isso não será necessário. Nós dois a conhecemos. Ela trabalhou num bufê na Reserva e nós ficamos amigos. É por isso que ele está aqui. Ele passou mais tempo com ela do que eu. Está bem familiarizado com seu cheiro. Vai ter mais facilidade em rastreá-la.
O xerife olhou de maneira chocada na direção de Valiant. 44
— Bem, acho que isso é bom. Quer dizer que sabem que garota boa que ela é e que temos que achá-la antes que os sequestradores tenham tempo de feri-la.
— Estou indo atrás dela. — rosnou Valiant, cheio de escutá-los perdendo tempo quando Tammy precisava dele. — Vocês fiquem aqui jogando conversa fora. Vou trazê-la de volta. — Ele saiu correndo em direção à floresta.
— Maldição, como ele é rápido. — O xerife soava impressionado. — Não vou conseguir acompanhar. Vão. Encontrem Tammy. Eles têm uma hora de vantagem.
Tiger rosnou.
— Espere, Valiant. Estou bem atrás de você.
Os olhos de Valiant se ajustaram à escuridão e seguiu as impressões claras e fundas que os pneus da caminhonete deixaram na grama alta. Sabia que Rider e Brass o seguiam de perto. Eles provavelmente tinham ordens de garantir que ele não matasse os machos humanos quando os achasse. Dois Espécies machos não seriam capazes de impedir que isso acontecesse se tivessem feito algo de mau a Tammy. Tiger devia ter trazido uns doze se aquela era sua intenção.
Valiant localizou a caminhonete e sentiu o cheiro de Tammy vindo da traseira na mesma hora. Pulou na caçamba e descobriu sangue. Agachou, farejou e só se acalmou um pouco quando percebeu que não era dela. Fechou os olhos e respirou um pouco para memorizar o mau cheiro dos machos. Uma raiva pura o atravessou porque pôde sentir o cheiro de medo de Tammy junto com o daqueles que a levaram. Ele se levantou e pulou para fora do carro.
Tiger e os outros dois oficiais observavam Valiant, esperando pela sua avaliação.
— Dois deles ficaram com ela na caçamba. Há sangue, mas não é dela.
Tiger assentiu. Valiant foi até a porta aberta do motorista. Parou e farejou, rodeando a porta e indo até o retrovisor quebrado. Ele rugiu quando seu corpo inteiro ficou tenso.
— O que foi? — Tiger se aproximou, mas a resposta estava lá quando inalou. — Sangue.
— Dela. — Valiant jogou a cabeça para trás e rugiu. — O sangue dela está nesse espelho quebrado, então eles a machucaram. Matarei todos por isso.
Brass limpou a garganta.
— Ela caiu aqui e fugiu, mas eles a seguiram. — Ele estava a uns seis metros da caminhonete próximo à linha das árvores.
Valiant se precipitou. Os quatro farejaram a área e estudaram as marcas no chão. As impressões pequenas eram mais difíceis de detectar à noite.
— Não faz muito tempo.
— Foi o que o xerife declarou. — confirmou Tiger.
— Eles a levaram a cerca de uma hora. Acha que ela escapou deles? — Ele fitava as marcas menores. — Uma fêmea correndo. Olhou para Valiant. — Ela é bem preparada fisicamente? Acha que ela poderia superar os agressores?
— Não. — rosnou Valiant. — Ela é pequena e não é páreo para quatro machos. 45
— É melhor os encontrarmos rápido. — Brass rosnou.
Os quatro correram. Eles pararam onde Tammy foi interceptada e os sinais eram claros para todos eles que ela havia caído no chão. Valiant rugiu outra vez quando descobriu mais sangue de Tammy.
— Calma. — Tiger rosnou baixo. — Estamos todos permitindo que o nosso lado animal nos controle, mas estamos lidando com humanos. Controle seus instintos enquanto caçamos. Eles não são cervos. Tenha isso em mente.
Rider rosnou de onde estava agachado, examinando as folhas reviradas.
— Um homem a carregou. As pegadas mostram o peso a mais.
— Estará morto quando eu alcançá-lo. — prometeu Valiant. — Vamos.
* * * * *
Tammy despertou e praguejou baixinho. Seu ombro, braço, costas e cabeça doíam. Parou de listar o que doía e tentou se concentrar no que não estava doendo. Seus pés e traseiro estavam ok, mas era só isso. Forçou-se a abrir os olhos para ver uma fogueira. Estava de lado, de frente para a fogueira, a alguns metros de distância das chamas. Virou a cabeça apenas para se arrepender no mesmo instante.
Quatro homens estavam sentados em um tronco caído olhando-a com raiva. Um deles, Terry, tinha tirado as botas de cowboy. Sangue seco manchava seu queixo e camiseta. Ela tinha dado uma cabeçada naquele. Outro tinha pedaços da camiseta enfiados no nariz que parecia ainda sangrar enquanto outro segurava o braço onde havia marcas de unhas que lhe asseguraram que ele era um dos imbecis que esteve na caçamba da caminhonete com ela. O quarto homem não parecia machucado.
Ela desviou os olhos deles e olhou para as árvores que os cercavam. Foi colocada na grama, mas quando tentou sentar, não conseguiu mover os braços. Repuxou e percebeu que a amarraram. Olhou-os com raiva.
— Meu cinto de couro está amarrando os seus pulsos, sua diabinha. Fique quieta. — Foi o homem que não estava ferido que disse em um tom raivoso. — Eu ainda digo que devíamos matá-la. Olhem a merda que estamos por causa dela. Ela quebrou o nariz de Ned quando o chutou na cara ao sair da caminhonete.
Tammy ficou surpresa. Não se lembrava de fazer aquilo, mas escondeu um sorriso, feliz por aquilo ter acontecido. Vagamente se lembrava de usar os pés para chutar e impulsionar o corpo para fora da carroceria. Achou que tinha usado o fundo da caçamba. O fato de ter sido a cara dele tornava isso melhor.
— Acho que dois dentes meus estão soltos. Ela meteu a cabeça na minha boca, — disse Terry e grunhiu enquanto a olhava com ódio. — Eu digo para pegar o meu cinto e estourar o traseiro dela com ele.
— Parem de choramingar. — o cara com o braço rasgado ordenou. — Precisamos da ajuda dela. Você ouviu o que nosso informante dentro daquela terra de animais nos disse. 46
Um deles a agarrou e a levou. Precisamos convencê-la a ir a público e dizer a todos o que ele fez com ela para ganhar apoio para nossa causa.
— Como se essa vadia fosse fazer isso. — Ned pausou. — Certo. Ela quebrou o meu nariz. Ela é tão animal quanto eles. Veio conosco em paz como uma verdadeira dama faria? Não. Lutou como se fosse um animal. Agora estamos presos aqui na floresta e sem transporte. Aquele carro nos seguiu e tenho certeza que o cara foi atrás da polícia. Provavelmente anotou a nossa placa. Provavelmente metade do estado está procurando por nós só porque ela não conseguiu ser razoável.
— Devíamos ter esperado, Paul. — Terry cerrou o cenho para o cara com o braço rasgado. — Ele nos ordenou que esperássemos para levá-la quando chegasse. Você foi o cuzão que achou que ela seria fácil de pegar. Disse que ia ser tão simples quanto comer torta. O chefe vai chegar em alguns dias e vai arrancar o seu couro e o nosso já que fomos imbecis a ponto de dar ouvidos ao seu plano meia-boca. Sabe o quanto o chefe a quer. Ele nos disse que tinha grandes planos para ela. Disse que podia convencê-la a fazer o que fosse preciso, mas agora estamos fodidos.
Csi Novas espécies 😂😂
ResponderExcluirTipo isso mesmo 😂😂😂😂
ExcluirEu amooo as maquinações violentas do Valiant 😂😂😂😂😈
ResponderExcluirSurrar os imbecis com os próprios membros 😂😂😂
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ExcluirSeria bem merecido 👀😈😈😂😂😂😂🙆
ExcluirEu acho os pensamentos do Valiant muito engraçados 😂😂😂
ResponderExcluirPróximo capítulo vai ser só dedo no c+ e gritaria
ResponderExcluirOuch! Em Slade, disse que o local do NE's era na Califórnia... agora é na Carolina do Norte. Correto!?
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