sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Capítulo 09


Capítulo 9 
O sol estava baixo no céu quando Slade voltou a cabeça para trás e olhou para Trisha. Tinha encontrado uma área de terra dentro da lateral da montanha. Uma enorme rocha que uma vez ocupou aquele espaço, mas o tempo e a gravidade fizeram com que rolasse morro abaixo, até a ravina. Tinha sido realmente difícil chegar até a área. Era tão íngreme que Trisha quase havia caído três vezes, e se não fosse por Slade, teria. Ele escalava atrás dela, com uma mão nela, e a apanhou toda vez que escorregou o pé.
— Está salva aqui. — Slade se agachou à sua frente e roçou com a mão sua bochecha machucada. — Ouvirá qualquer um que venha de baixo e é muito instável mais acima para que usem cordas para tentarem escalar até aqui.
— Ok.
— Quero que espere aqui onde o meu pessoal pode encontrá-la se eu não voltar. Pode levar alguns dias, mas alguns dos machos que mandaram foram treinados comigo antes de sermos libertos. Eles sabem como eu penso e vão perceber que tipo de esconderijo eu procuraria para colocá-la. Não atire neles quando chegarem, Doutora. — Ele lhe deu um sorriso forçado. — É falta de educação ferir ou matar alguém tentando te resgatar.
Trisha não retribuiu o sorriso, sabendo que ele tentava usar o humor para neutralizar o estresse, mas estava preocupada demais com ele.
— Volte para mim.
Seu sorriso sumiu.
— Não posso garantir isso, Doutora. Não faço promessas que não posso cumprir.
— Então fique aqui comigo, onde estamos seguros. Por favor? Podíamos simplesmente esperar bem aqui juntos.
Slade hesitou.
— Eu não achei que havia tantos deles nos caçando, Doutora. Aqueles homens que eu matei não são os mesmos que nos seguiram na estrada quando caímos. Eles obviamente têm times diferentes por aí procurando por nós. Sabe disso porque os ouviu. Isso a coloca em extremo perigo e só há um jeito de lidar com essa situação. Preciso caçar os caçadores e virar o jogo contra eles. — Ele pausou outra vez, olhando intensamente para ela.
— Mas...
— Eles não vão esperar isso de mim e eles precisam perder a vantagem da quantia de homens. Pode levar algum tempo para o meu pessoal nos alcançar e eu preciso nos ajudar a sobreviver. Esses imbecis vão se confundir quando se virem sob ataque. Alguns vão fugir quando pessoas começarem a morrer. Isso vai eliminar os covardes dos realmente perigosos. Esses são os que precisam morrer. É a única forma de protegê-la, Doutora.
— Mas esse é um ótimo esconderijo. Fique aqui comigo, Slade. Por favor. Eu imploro se tiver que implorar. Estou morrendo de medo que eles o machuquem, ou coisa pior. Você é só um homem e tem muitos deles por aí. Palavras suas.
Slade inclinou levemente a cabeça e apertou a boca em uma linha firme. Laurann Dohnner Slade
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— Não sou só um homem, Doutora. Sou uma coisa bem pior com uma vantagem, quer eles saibam ou não.
Ele hesitou.
— É isso que eu sou. Eu sou um Nova Espécie e tenho algo que considero importante para proteger. Mas isso não é só sobre eu e você e não quero que se sinta culpada se algo acontecer comigo. Minha gente está vindo e não quero que caiam em nenhuma armadilha, o que é uma possibilidade. Preciso eliminar o máximo que puder desses imbecis. Sou um predador por baixo da minha humanidade. Posso tentar esconder, mas não há como fugir. Também sou um sobrevivente que teve que matar no passado para continuar respirando. Mercile me treinou para lutar e exibir os remédios que fabricavam é uma lição pela qual estou grato neste momento.
— Não tem que lutar com eles. Não está mais preso em uma cela e podemos nos esconder. Pelo o que eu entendo, você nunca foi treinado para ser colocado em uma zona de guerra real, o que faz esse seu treinamento não valer de nada. Eles só o ensinaram o suficiente para que mostrasse o que podia fazer, mas isso é real, Slade. Eu não quero que morra.
Ele respirou fundo.
— Sempre foi real. Nem todos da minha gente sobreviveram os testes cruéis deles nem os shows que nos forçavam a dar para demonstrar os resultados das drogas. Eu sou perigoso, mesmo que nunca tenha desejado ser. Quer aceite isso ou não, é a verdade. Eles nos treinaram bem demais e nos tornaram menos do que inteiramente humanos. Não era intenção deles nos libertar um dia, mas isso aconteceu. Eu sou um Nova Espécie. Você é uma médica, mas só porque não está dentro de um hospital não quer dizer que tenha deixado de ser. Ajudaria qualquer pessoa ferida se pudesse sem levar em conta se está no horário de trabalho ou não, não ajudaria?
Trisha odiava a sua lógica.
— Sim, mas não quero que vá. Fique comigo. As chances são que quando seu pessoal chegar esses idiotas se assustem e vão embora. Tenho certeza que nunca imaginaram que haveria uma busca por nós.
— Não me tente, Doutora. Me meter com você nesse buraco por um dia ou dois… — Ele piscou. — Eu ia gostar muito de passar o tempo evitando que ficássemos entediados.
— Fique comigo. — Esperança brotou dentro de Trisha. Ela só o queria a salvo, com ela.
— O risco é muito grande se eu ficar com você e não fizer nada. Tem muitos deles e eles podem se espalhar para procurar em vários lugares. Se formos encontrados eles podem nos cercar. — Ele olhou ao redor da caverna e de volta para ela. — Poderia ser atingida por uma bala se houver um tiroteio. Tem muitas rochas nessas paredes onde as balas poderiam ricochetear e atingir você. Não vou permitir que isso aconteça. Também não temos balas o suficiente. Também podem começar um fogo e nos matar queimados. É melhor se for atrás deles do que arriscar que nos encurralem aqui. Vou garantir que qualquer um que chegue perto de você deixe de respirar.
Ela mordeu o lábio, esquecendo o machucado, e fez uma careta ante a dor instantânea. Slade roçou o dedo em sua boca, fitando-a.
— Vai precisar ficar abaixada, nada de se levantar ou se mover muito. Esse seu cabelo loiro pode chamar atenção e não se mistura à montanha. Lembre de ficar fora do campo de visão. Vou deixar as armas do acampamento com você caso algum deles passem por mim ou me eliminem. Laurann Dohnner Slade
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Essa pistola é tudo o que preciso. Só dispare quando estiverem perto o bastante para que não erre e quando não tiver escolha. O barulho vai ressoar longe e atrair mais deles nesta direção. Isso seria péssimo.
Trisha fitou seus olhos quando encontraram os seus. Fez o que mais queria fazer. Inclinou-se para frente, segurou o rosto de Slade e viu surpresa atravessar suas feições um segundo antes de roçar a boca na dele. Testou a suave textura dos seus lábios carnudos, ouviu o som que fez no fundo da garganta, e então tomou o controle do beijo.
Ele o aprofundou, a língua encontrando a sua. Ela ignorou a dor no seu lábio cortado, até mesmo o gosto do seu sangue misturado ao gosto de Slade, só desejando, necessitando se perder naquele beijo. Seus braços circularam o pescoço dele e ele a levantou quando passou os dele em volta da sua cintura, agarrando seu quadril para aproximá-la, pressionando-os peito a peito. Slade de repente grunhiu e tirou a boca da sua, respirando com dificuldade.
— Trisha — grunhiu ele. — Está dificultando as coisas para mim e se sentasse no meu colo saberia o quanto está tornando tudo duro. Tenho que ir agora. Por favor, não piore as coisas. Isso precisa ser feito e tenho que ir enquanto ainda há luz suficiente para poder seguir com rapidez. Minha visão noturna não é tão boa como a que tenho durante o dia.
Ela sabia que tinha perdido na discussão e que ele estava determinado a caçar aqueles homens. Ele planejava sair por aí a fora e arriscar a vida tentando salvar a dela. Lágrimas ameaçaram escorrer de seus olhos, mas ela piscou rapidamente para contê-las.
— Ok. Mas volta para mim, Slade.
Um sorriso de repente curvou seus lábios.
— O que vai me dar quanto eu voltar, Doutora?
— O que quiser.
Ele arqueou as sobrancelhas e seu sorriso aumentou.
— Qualquer coisa?
—Qualquer coisa — repetiu firmemente. — Só não acabe morrendo.
Slade assentiu.
— Fique abaixada, quieta, e com as armas à mão. Use-as somente se tiver que usá-las e evite que se aproximem o máximo que puder. Eu vou ouvir se tiver que atirar contra alguém e vou voltar. Não provoque mais os imbecis para que acabem te matando. Lembre-se apenas de sobreviver para que eu tenha algo o que salvar. Você me prometeu isso, doçura. Vou contar com a sua promessa.
— Eu lembro e prometo. Jure-me que não vai se arriscar demais. Sobreviva, Slade.
Slade assentiu outra vez, estudou-a intensamente como se tentasse memorizar seu rosto, e então se afastou, soltando-a completamente. Ele se forçou a deixar de olhá-la antes de recolher alguns itens depressa e enfiá-los nos bolsos. Olhou-a outra vez bem rápido e começou a descer do lugar onde se escondia. Tinha desaparecido em segundos.
Trisha teve que conter o apelo de implorar que voltasse, certa de que o que quer que dissesse, não o faria mudar de ideia.
Desenrolou o saco de dormir na terra dura e imperdoável para se ocupar. O chão de terra estava repleto de pequenas pedras e pedaços de barro. Mesmo no saco de dormir ainda podia Laurann Dohnner Slade
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sentir o chão desconfortável debaixo do grosso material quando se sentou para verificar os objetos que possuía.
Slade tinha conseguido dois pares de binóculos e tinha deixado um para trás, em sua mochila. Encontrou-os e destampou as lentes. Usou-os e não demorou muito para avistar Slade. Ele se movia incrivelmente rápido sem ela.
Ela virou a direção dos binóculos, vasculhando a área, mas não avistou mais ninguém. Podia ver bem longe com a ajuda das poderosas lentes. Voltou sua atenção para Slade, soube quando alcançou o fundo da ravina à sua esquerda. Ele se voltou e examinou a área onde ela se escondia e então começou a correr. Trisha manteve o foco nele.
A escuridão estava a vir rápido demais para o gosto de Trisha. Tinha perdido Slade no meio das árvores, mas às vezes o avistava no meio da densa folhagem. Ele ia depressa, não mostrava sinais de cansaço, e parecia se dirigir a um destino certo. Perguntou-se se havia farejado alguém com seu olfato incrível.
Voltou a se afundar no buraco escuro e teve que ir tateando até encontrar o zíper da mochila. Tinha visto Slade levar toda a carne seca, mas ele lhe deixou as barras de cereal que tinham achado. Comeu duas e tomou uma soda antes de rastejar de volta à abertura. Deu uma olhada na escuridão abaixo e então ofegou. À distância avistou uma luz fraca que vinha da mesma direção para onde Slade ia.
Trisha podia ver que tinha de ser um acampamento. Chamas apareciam por entre árvores maciças, não mais do que chamas distantes, até mesmo com o binóculo. Tinha um pressentimento desconfortável que era para lá que Slade se dirigia.
Sentou e arrastou o saco de dormir para a beira, onde se sentia confortável, grata por ter ao menos um lugar para tentar vislumbrar Slade. Ele estava em algum lugar lá fora e ela se preocupava.
Se Slade conseguia sentir o cheiro da fogueira deles e planejava atacar, era ali que isso aconteceria. O tempo pareceu demorar uma eternidade para passar, mas nenhum som distante de luta chegou aos seus ouvidos.
Ficou mais confortável deitada no estômago e apoiada nos cotovelos em cima do saco de dormir enquanto continuava a avistar pedaços de chamas.
Mais tempo se passou e ficou deitada na mesma posição. Bocejou e lembrou-se do quanto estava exausta. Adormeceu até que um único disparo de arma a acordou.
Trisha tentou sentar ao mesmo tempo em que apontava os binóculos desesperadamente na direção da fogueira. Passou segundos procurando na escuridão até encontrar a luz vacilante.
Sua atenção permaneceu nela até que sumisse, desaparecendo na escuridão. Tiros não foram mais disparados. Isso lhe deu esperança de que ele poderia ter sobrevivido ao ataque ao acampamento.
Lutou contra a vontade de derramar lágrimas por Slade estar lá fora sozinho. Ele poderia morrer se algum deles tivesse sorte com o tiro. Tirou o saco de dormir da beira do buraco e se aconchegou em posição fetal em cima dele. Precisava dormir e não teria chance de ver Slade até que o sol nascesse. Laurann Dohnner Slade
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* * * * *
Slade ficou abaixado, observando os quarto homens no acampamento com ódio. Podia ouvir suas palavras e isso fez com que o seu sangue fervesse. O cheiro do cervo que tinham caçado e cozinhado se espalhava junto com a fogueira que permitiram que fosse se apagando naturalmente.
— Acha que o animal vai implorar pela vida quando o encontrarmos? — O com a jaqueta jeans perguntou ao de camisa preta.
— Espero que sim. — Ele riu. — Eu trouxe a minha câmera para filmar tudo. Precisamos mostrar as pessoas de bem que eles não são homens.
O da jaqueta bufou.
— Malditos animais de duas patas. Não basta termos que proteger nosso país deles, mas também temos que proteger nossas mulheres. Primeiro eles vão querer ter direito a voto, depois vão querer o casamento. Se as mulheres deles se parecerem com os homens eles vão correr atrás das nossas irmãs e filhas. É simplesmente doentio. Acho que eles ocultam a aparência de suas mulheres por alguma maldita razão. Provavelmente são cruzamentos de mulas e têm cara de jumentas.
Um dos homens riu.
— Feias que nem um cu.
— Eles nunca deviam ter sido libertos. Não saímos por aí soltando macacos cobaias de testes. De jeito nenhum. — O homem de camisa preta escorou as costas no tronco, colocando as botas próximo ao fogo. — Eles são perigosos e provavelmente mais pirados que internos de manicômio.
O loiro que ficava calado franziu o cenho de repente.
— Tortas de fruta por acaso levam nozes também? Eu não como essa porcaria. São muito feias para se comer. — Ele fez uma pausa. — Eles usam mesmo macaquinhos fofinhos para testar aquelas merdas que as mulheres usam na cara? Macacos são legais. Eu sempre quis ter um macaco de estimação quando era criança.
— Sei lá. — O cara de camisa preta deu de ombros. — É o que dizem. O que estou querendo dizer é que eles devem ser completamente doidos. Você não solta animais enjaulados nem deixa que corram por aí. É perigoso e é por isso que todos eles precisam ser eliminados. Com certeza não são fofinhos e eu não queria ter um de estimação. Provavelmente iria querer trepar com a minha mulher.
O loiro riu.
— Já vi sua mulher. Duvido.
O cara de camisa preta jogou a caneca no amigo, atingindo seu braço.
— Vá se foder, Mark.
— Deixem disso — o que estava sentado mais longe da fogueira suspirou. — Ainda não achamos nosso alvo e a cada hora que passa ele tem mais chances de escapar da área de algum jeito. As estradas estão fechadas pelas nossas equipes. Estão presos na área, mas aquela mulher que está com ele é algum tipo de médica. Isso significa que ela é esperta e provavelmente está Laurann Dohnner Slade
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pensando por ele. Eles podem ter achado um buraco para se esconderem. É isso o que eu faria. Precisamos cruzar muito chão amanhã assim que amanhecer, encontrá-los e matá-los. Não vim até aqui para falar merda nem ofender ninguém. Eu quero a recompensa.
— Eu não vou pendurar a cabeça dele na minha parede. — O loiro estremeceu. — Eles são sinistros e simplesmente feios. Claro que seria ótimo mostrar uma peça assim para uma visita. Eu podia me exibir dizendo que o cacei.
Slade já tinha ouvido demais. Não permitiria que aqueles homens deixassem o acampamento. Estavam perto demais de Trisha e procuravam por prováveis abrigos. Ele deu a volta no acampamento e esperou até que os homens se preparassem para dormir. O loiro se levantou, espreguiçou-se e se afastou do lugar para urinar.
Ele não ouviu Slade vindo por trás até estar com as mãos nele. O homem menor só ofegou quando uma palma tapou sua boca, ele saiu do chão, e a faca presa à sua coxa foi retirada e pressionada em sua garganta.
— Calado — ordenou Slade.
O loiro respirou agitado, mas não tentou gritar.
— Tem mais de vocês por perto?
O cara hesitou antes de assentir devagar.
— Mais que os outros três do seu acampamento?
O loiro assentiu outra vez. As notícias enfureceram Slade. Precisava encontrar os outros acampamentos, eliminar a ameaça a Trisha, e pegar os telefones deles. Com sorte um funcionaria. Podia ligar para Homeland e ajudá-los a localizarem Trisha mais rápido. Ela precisava sair daquela confusão arriscada depressa.
— Eu vou amarrar você e ir atrás dos seus amigos. Se não lutar, não vou te matar. Vou deixar você aqui até o meu pessoal chegar. Entendeu-me?
O loiro assentiu. Slade queria os humanos mortos, mas não estava em Homeland. Não tinha certeza se a lei estava ao seu favor. Autodefesa era uma coisa, mas o homem que tinha nas mãos não apresentava nenhuma ameaça atual. Odiava-os, mas não era um assassino de sangue frio apesar da opinião baixa que tinham dos Novas Espécies.
Ele relaxou o braço e o loiro agiu repentinamente. O cara tentou se soltar e virou a cabeça. Ele sorveu ar para soltar um grito, mas Slade foi mais rápido.
Quebrou o pescoço do homem. O som do osso partindo o deixou enjoado quando deixou que o corpo caísse ao chão. Virou para olhar o acampamento, mas avistou um movimento repentino. Outro humano vinha até ele. O cara não parecia vê-lo no escuro até o último segundo.
O choque do humano foi aparente quando ele desesperadamente agarrou a arma presa ao peito em um coldre. Slade jogou a lâmina em sua mão e se arremessou para agarrar o braço e a garganta do homem. O humano caiu sem lutar muito. Colocou o homem morrendo no chão, fitando os olhos do seu inimigo.
— Vamos matar você e aquela vadia da sua dona — chiou o homem antes de morrer.
Slade o soltou, sua raiva aumentava pelo cheiro de sangue e morte. Seus instintos o comandavam com força. Proteja Trisha. Aqueles homens não sentiam compaixão. Não mereciam receber o que não possuíam. Estavam caçando uma mulher indefesa e um Espécie em um esporte Laurann Dohnner Slade
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mortal movido a dinheiro. Rosnou baixinho, liberando seu lado humano e abraçando os instintos do predador que fazia parte dele e que surgiam tão naturalmente.
Mate-os, tenha certeza de que não representam ameaça a minha mulher, e não mostre misericórdia. Lembranças dos anos que passou preso surgiram em sua mente. Aqueles homens eram tão maus quanto os que mantiveram os Espécies prisioneiros. Não enxergavam sua gente como nada além do que animais raivosos. Um rosnado baixo rasgou de sua garganta quando tirou a faca do corpo e se levantou. O único jeito de impedi-los de chegarem até a médica era matar cada um deles. Podia fazer isso. Faria qualquer coisa por Trisha.
Seu olhar foi em direção ao acampamento enquanto se movia furtivamente. Os humanos morreriam, mas Trisha não. Garantiria isso não importa quantos tivesse que matar.
* * * * *
Estava claro do lado de fora quando Trisha acordou novamente. Aproximou-se da abertura deitada sobre o estômago, agarrando o binóculo para vasculhar a área. Teve cuidado em se mover devagar e tentou usar um padrão para não passar batido nenhuma seção. Não viu ninguém nem nada. Desistiu finalmente depois de uma hora e tentou descansar mais um pouco no saco de dormir.
Bebeu metade de uma soda, guardou o resto, e comeu mais uma barra de cereal.
Preocupava-se com a possibilidade de Slade não voltar, sabendo que poderia ter morrido. Ficou ali deitada, com os olhos fechados, a imagem dele assombrando seus pensamentos. Não tinha certeza de que tipo de relacionamento teriam se sobrevivessem. Eles ao menos tinham um no momento? Ele a tinha chamado de sua. Isso tem que significar alguma coisa, decidiu. Deu-lhe esperança que teriam um futuro esperando por eles se evitassem serem assassinados.
Um som a despertou de um sono leve pouco tempo depois. Trisha ficou quieta escutando até ouvir o ruído de novo. Sentou-se, o coração martelando no peito, percebendo que aquilo parecia com... não tinha certeza, mas o som era familiar por alguma razão. Outra vez o ruído soou. Merda. Parecia que pedras ou algo tão pesado quanto estivessem caindo. Ela se moveu e agarrou a pistola, já que era a menor das armas, mais fácil de empunhar do que os dois rifles que Slade tinha lhe deixado.
Rastejou até a abertura com a barriga no chão para espiar embaixo e recuou bruscamente quanto viu alguém se mexer abaixo de onde estava. Recuou mais, ainda de bruços, e pegou também um dos rifles. Lutou contra o medo e se aproximou da abertura. Aproximou-se da beira, deitando o rifle do lado para mantê-lo ao alcance. Ficou o mais abaixada possível para espiar pela extremidade outra vez até que os viu. Dois homens estavam a uns oito metros abaixo dela, escalando a lateral do morro onde se escondia. Abaixou a cabeça.
Os dois usavam roupas verdes camufladas e iam diretamente ao lugar onde se escondia. Esperava que não a tivessem visto, assumiu que não, já que não tinham falado. Eles chegariam na abertura muito em breve se não fizesse alguma coisa. Perguntou-se como a encontraram e se eram Novas Espécies. Eles normalmente usavam uniformes pretos, mas eles também os vestiam fora de Homeland? Não sabia. Laurann Dohnner Slade
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Podia ficar ali sentada esperando que a encontrassem ou poderia afastá-los. Não sabia o que fazer. Desejou desesperadamente que Slade não a tivesse deixado porque ele saberia como lidar com a situação. Ao menos Slade poderia farejá-los e dizer se eram sua gente ou inimigos.
A indecisão a dividia ao meio. Disse um palavrão baixinho e então decidiu que tinha que impedir que subissem mais. Se alcançassem a abertura não tinha certeza se poderia atirar neles antes que atirassem nela já que estavam em vantagem. Slade lhe disse para que os afastasse com as armas e ele ouviria os disparos. Imaginava como aqueles homens tinham passado por ele, mas realmente não importava, porque tinham passado. Moveu-se rapidamente de novo e pegou a última arma. Queria todas as três disponíveis.
Rastejou e espiou pela beira novamente, mas não conseguiu ver os seus rostos. Segurou a pistola e esperou até um deles levantar o rosto. Ele parecia ter por volta dos vinte e cinco. Trisha se inclinou mais para apontar a arma para ele. Seu olhar arregalou em surpresa quando a viu.
— Já chega — disse ela. — Não se mexam ou eu atiro. Quem são vocês?
O homem ao lado do primeiro levantou o queixo e ela também pôde ver o seu rosto. Era um pouco mais velho do que o seu companheiro, no começo dos trinta, com barba, e uma expressão fria.
Trisha continuou olhando de um para o outro. Estavam pendurados em uma área escarpada abaixo dela, ela se lembrou vividamente como tinha sido difícil escalar, e os dois tinham que se segurar para não caírem. Seria uma queda dolorosa se eles se soltassem, se não mortal. Eles estavam a uns bons quinze ou vinte metros de altura.
— Somos Novas Espécies — o mais jovem declarou firmemente. — Viemos resgatá-la, Dra. Norbit.
Ela mordeu o lábio, estudando suas feições. Ele parecia cem por cento humano, mas o outro também. A maioria dos Novas Espécies tinham anomalias faciais distintas similares as de Slade, com seu nariz achatado e maçãs do rosto acentuadas. Justice North tinha as mesmas anomalias e olhos de gato. Todo homem Nova Espécie que tinha visto tinha cabelos compridos que caíam pelo menos até os ombros, mas aqueles homens tinham cortes bem baixos.
— Não acredito em você. — Medo a encheu, sabendo que estavam tentando enganá-la.
— É verdade. Justice North nos mandou. — Ele sorriu, mas o sorriso não alcançou seus olhos.
Merda. Como poderia dizer com certeza? Odiaria atirar nos homens errados, mas de repente uma ideia lhe veio.
— Sente cheiro de quê?
Ele piscou.
— Está muito longe para que consiga sentir o cheiro — respondeu ele depois de alguns segundos. — Somos Espécies Primatas.
Aqueles eram raros, ela só havia visto um, mas tinha conseguido dizer o que era por causa das anormalidades faciais consistentes com a de um primata—um nariz achatado e pálpebras arredondadas. Isso aumentou sua suspeita de que mentiam para ela. Contudo, estava disposta a atirar neles, com cem por cento de certeza de que estavam mentindo? Ainda não. Odiaria estar enganada já que só havia visto um Espécie primata. Laurann Dohnner Slade
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Eu sou uma médica, lembrou a si mesma. Eu devia ser inteligente. Pensou por um segundo e então sorriu.
— Qual é a senha de hoje? Novas Espécies sabem da senha da vez e eu quero que me diga. — blefou.
Ele ficou levemente pálido.
— É laço.
Ele é bom. Concederia isso. Não tinha perdido tempo em achar uma resposta para lhe dar. Ela sorriu.
— Resposta errada.
— Foi trocada depois que vocês saíram da estrada — disse o outro homem rapidamente. — É laço hoje. Justice mudou a senha porque ficou com medo que fosse comprometida se seu homem fosse obrigado a falar.
Talvez eles de fato usassem senhas. Esse pensamento a fez hesitar. Trabalhou em palpites, mas seria razoável se usassem senhas ou códigos secretos. Estavam aprendendo com os humanos desde que tinham sido libertos. Decidiu que não era prova o bastante já que havia uma possibilidade. Precisava ter mais provas antes que pudesse ter certeza que estavam lhe enrolando ou falando a verdade. Seria horrível se atirasse em um Nova Espécie verdadeiro. Slade poderia nunca mais perdoá-la e ela jamais se recuperaria da culpa.
Tinha jurado salvar a vida deles, não tirá-las, quando tinha aceitado o emprego em Homeland.
— Se vocês são quem dizem que são então saberão o nome do homem que Justice mandou para me levar até onde ele queria que eu fosse. Digam-me o nome do Nova Espécie, não do motorista humano.
O segundo homem falou.
— Seu nome é Slade.
Ela vacilou um segundo, mas depois lembrou que Slade tinha lhe dito que Justice provavelmente publicaria seus nomes para anunciar que estavam perdidos na tentativa de juntar pessoas para ajudar a encontra-los. O nome de Slade podia estar na mídia junto ao seu. Desistiu daquela linha de interrogação.
Apertou o dedo no gatilho.
— Qual era a senha de ontem, então? — Queria saber até onde eles levariam aquilo.
Os homens se olharam de maneira nervosa. O mais novo olhou para cima.
— Ontem foi o meu dia de folga. Não tenho certeza, mas a de hoje é laço. Vamos subir para pegá-la, Dra. Norbit. Temos uma equipe a mais ou menos uma milha daqui e vamos levá-la de volta a Homeland. Está sendo resgatada.
Se havia um sistema de códigos, o cara saberia, especialmente desde que supostamente era um membro de um grupo de resgate indo atrás de um Nova Espécie sem contato com seu povo. Já que ele não sabia, percebeu que seu blefe havia funcionado.
— Não existe senha, imbecil.
Ela viu os dois olharem um para o outro, a preocupação clara em ambos. Um deles moveu a mão e colocou-a em algo à sua cintura. Laurann Dohnner Slade
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— Vou pegar a minha identificação — avisou alto. — Realmente usamos senhas em Homeland. Todos os seguranças usam.
— Então vocês são os seguranças dos Novas Espécies? E são Novas Espécies? Segurança é o título do seu trabalho, então?
Os dois assentiram. Não podia acreditar como eles mentiam com tanta facilidade. Paul lhe disse que Novas Espécies nunca se chamavam de seguranças, ao invés disso, eles preferiam o título de oficiais. Odiavam o outro termo. Ela o observou enquanto removia algo de trás da calça. Imaginou se iria tirar a carteira e tentar enganá-la mostrando a carteira de motorista. Ao invés disso ele tirou uma arma.
Trisha entrou em pânico ao vê-la, colocou a pistola na direção dele e disparou.
Duas armas ensurdeceram seus ouvidos desprotegidos antes dele revidar. A bala dele atingiu a terra acima dela, fazendo com que chovesse em suas costas. A terceira bala que disparou, atingiu-o.
Ele gritou quando perdeu o prumo e caiu morro abaixo. Ela virou a arma para o outro homem que lutava para tirar algo do cinto, com uma mão só, enquanto tentava não tirar a outra da pedra em que se agarrava. Ela viu um metal preto quando sua mão reapareceu. Arma!
Trisha disparou e o acertou com um tiro só, melhorando a mira. Viu uma parte do seu rosto onde sua bochecha jorrava sangue e ele gritou.
Ele soltou a mão e caiu para trás. Ela ouviu um barulho horrível de queda quando ele chegou ao chão.
Trisha saiu mais da abertura para ver os dois homens caídos lá embaixo. Um deles tinha caído de lado e não se movia, cheio de líquido vermelho se espalhando no solo ao seu redor. O outro homem, o primeiro a cair, estava com o rosto para cima. Ele mexeu um braço e ela o ouviu gemer mesmo de onde estava. Sangue cobria o seu rosto e a área do ombro.
Ela o observou enquanto ficou lá deitado, movendo a perna, e então o viu pegar algo dentro do bolso. Quando ele tirou um walkie-talkie ela percebeu que ele iria revelar sua localização. Mais daqueles idiotas viriam se ainda não tivessem ouvido os disparos. Tinha que impedi-lo, sabendo que não conseguiria conter mais deles se todos aparecessem por lá. Rastejou mais até seu corpo ficar parcialmente pendurado na extremidade. Encheu-se de medo ao ver o quanto estava longe do chão. Poderia mergulhar em sua própria morte se deslizasse de onde se encontrava instavelmente pendurada e seria incapaz de evitar a queda. Apontou a arma e apertou o gatilho, vendo-o se sacudir quando a bala passou pelo seu peito. O rádio em sua palma caiu no chão. Ele a olhava com os olhos esbugalhados, mas ela soube que havia morrido quando não piscou, não se mexeu, depois de passar um bom minuto.
Trisha lutou contra a vontade de vomitar enquanto observava os dois, determinou que estavam obviamente mortos e que ela que os matou. Ergueu e empurrou a parte superior do corpo de volta à pequena caverna, ainda segurando a pistola dolorosamente com os dedos. Olhou para a arma e a soltou quando lágrimas a cegaram. A realidade do que tinha feito a atingiu com força. Laurann Dohnner Slade
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O choque que experimentou a deixou se sentindo gelada por dentro. Quando se tornou uma médica jurou salvar vidas, mas tinha acabado de tirar duas. Foi autodefesa! Sua mente lhe gritou. Autodefesa. Eu não tive escolha. Nenhuma.
Forçou-se a respirar fundo com o intuito de se acalmar e se lembrou de Bill. O que ele tinha ameaçado a fazer com ela e como bateu nela não eram coisas que um dia se esqueceria. Aqueles homens faziam parte do grupo de Bill e também teriam feito coisas horríveis com ela.
Lembrou-se de como três daqueles homens só a tinham mantido viva para que cuidasse de seu amigo ferido. Não tinha dúvidas de que os homens em quem tinha atirado a teriam matado da mesma forma que mataram Bart. Forçou-se a respirar fundo, com calma, e finalmente readquiriu algum controle sobre suas emoções abaladas. Queria chorar, mas as palavras de Slade de quando tinham ouvido os tiros depois de terem deixado Bart no local do acidente soaram em sua mente.
— Sobreviva primeiro, chore depois — sussurrou em voz alta.
Trisha queria tanto que Slade estivesse com ela que isso acabou se transformando em uma dor que dolorosamente não passaria. Estaria a salvo com ele. Sabia que a abraçaria e diria algo que faria com que se sentisse melhor, que a distrairia da angústia que sofria. Esperava que estivesse voltando para ela ao invés de indo atrás de mais daqueles homens.
Olhou para a pistola que tinha derrubado e controlou suas emoções. Slade ordenaria que sobrevivesse e ela tinha lhe prometido que faria qualquer coisa, que sofreria qualquer coisa, para continuar viva até que ele conseguisse resgatá-la. Ele não queria que sentisse pena de si mesma. Esperava que usasse a cabeça. Laurann Dohnner Slade
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