Trisha sabia que não chegaria a Reserva sem ficar completamente mortificada. Brass esfregou suas costas com gentileza enquanto ela sentava em seu colo. Ela lutou contra a vontade de vomitar no chão inteiro. Olhou tristemente para Moon e Harley.
Os dois lhe deram olhares de simpatia, sabiam de sua gravidez, e juraram segredo. Eles iriam protegê-la, vivendo com ela, e precisavam saber a verdade. Ela olhou para o chão e usou a mão para acenar para eles. Os dois rapidamente levantaram os pés. Moon sorriu.
— Vomitar em movimento não é engraçado! — gritou ela. Não tinha certeza se ele a escutou com o barulho alto do helicóptero e com o fone e protetor de ouvidos que usava para manter contato com os pilotos, mas Moon piscou em resposta, fazendo-a acreditar que tinha sim escutado.
— Estamos quase lá — disse Brass próximo ao seu ouvido. — Aguente mais um pouco, Trisha.
Ela assentiu miseravelmente. Seu estômago começou a surtar, mas não queria vomitar.
Sentir-se-ia humilhada se todos os três a vissem perder o café da manhã, sem mencionar os pilotos tendo que limpar o vômito depois que aterrissassem. Fechou os olhos, mas isso fez com que o enjoo só aumentasse. Conseguiu sentir o helicóptero descendo. Graças a Deus. Está quase acabando. O helicóptero aterrissou e o piloto começou a desligar os motores.
Moon se moveu primeiro quando abriu a porta lateral e pulou para fora. Harley saiu em seguida. Eles se separaram e ficaram de pé de cada lado da porta. Trisha tentou se levantar sozinha, mas seus joelhos tremiam tanto que vacilou no instante em que colocou o peso neles. Brass a colocou nos braços onde a aninhou contra o peito quando se abaixou para carregá-la para fora do helicóptero. Harley e Moon seguraram os dois braços de Brass e levantaram ele e Trisha até o chão. Isso impediu que Brass a sacudisse se tivesse que pular.
Trisha descansou a cabeça na curva do ombro largo de Brass. Ela o abraçou em volta do pescoço quando o mundo girou um pouco. Odiava sentir enjoo decorrente de movimento. Brass mudou sua posição, apertando-a mais forte contra o peito, para deixá-la mais confortável.
— Segure-se em mim — sussurrou ele. — Vamos deitá-la e eu vou colocar um pano frio molhado na sua testa. Vai se sentir cem vezes melhor.
— Obrigada — murmurou para Brass. — Você é o melhor.
Ele riu.
— Eu sei. É um karma difícil que estou disposto a carregar.
Ela sorriu, realmente grata por tê-lo como amigo. Ele sempre sabia como fazê-la sorrir. Ouviu Harley falando, mas não ousou levantar a cabeça do ombro de Brass para ver com quem falava, ainda lutando contra a vontade de vomitar. Laurann Dohnner Slade
130 | P R T
— Ela está com enjoo. Vai ficar bem assim que a colocarmos em uma cama e lhe dar tempo para que se recupere.
— É mesmo? — A voz masculina soou furiosa e era uma que Trisha conhecia muito bem. Ela ficou tensa e levantou a cabeça, sem se importar com as consequências.
Slade estava a mais ou menos dois metros dela. Ele emitia faíscas quando olhou dela para Brass e de novo para ela. Trisha sabia que se olhares matassem estava nos últimos segundos de vida e essa reação dele a confundiu. Por que ele está com tanta raiva? Ele me odeia? Ele obviamente tinha problemas com sua presença próxima a ele. Seus olhares se encontraram e se prenderam.
Trisha notou que o cabelo de Slade tinha crescido um pouco desde a última vez que o viu. Ele usava o uniforme preto de costume do ONE, menos a camiseta. Ao invés de ONE estampado no peito da camisa, seu nome tinha sido impresso no espaço. Ele parecia em forma e lindo. Trisha até teria achado que parecia sexy se não fosse pela fúria homicida que viu em sua expressão. Seu coração deu uma cambalhota por estar outra vez perto dele.
— Trisha? — Surrurrou Brass em seu ouvido. — É ele, não é?
Ela virou a cabeça e encontrou seu olhar. Brass a fitou por um segundo e ficou tenso.
— Merda. — Ele assentiu. — Vamos colocá-la numa cama.
Brass se virou com Trisha e caminhou em direção a um Jipe. Slade bloqueou o caminho deles, ainda olhando para Trisha com raiva.
— Que bom te ver, Doutora.
— Olá. — disse.
Sua atenção saiu dela por uns segundos quando ele olhou para Brass, Harley e para Moon, depois olhando de novo para ela. Finalmente fulminou Brass com o olhar, sem desviar.
— Qual é o nível da ameaça que ela recebeu? Justice não foi claro e eu tive que ter cuidado com o que dizia porque havia um humano perto de mim na hora da conversa. Ele vive em reuniões desde então, e não pode retornar minhas ligações.
— Quatro. — Brass franziu o cenho. — Ela é a nossa maior prioridade, e de vocês também. Ninguém que não for Nova Espécie deve ter acesso a ela. Nenhum humano, sem exceção.
Aquela informação fez Slade empalidecer um pouco.
— Nenhum humano? Estamos no meio de uma enorme construção e temos humanos andando por toda a Reserva. Tenho centenas deles aqui vinte e quatro horas por dia para terminar todos os projetos que precisamos que terminem assim que possível. Estamos fazendo coisas em poucos meses que normalmente levariam um ano inteiro para terminar. Levou quase quatrocentos humanos em três semanas inteiras só para levantar aqueles muros de segurança para fechar a propriedade. Temo-os trabalhando em dois turnos o dia inteiro, sete dias por semana. Ainda estamos colocando arames nos muros por questões de segurança e eu tenho um hotel sendo reformado em ritmo acelerado. Vamos precisar das moradias terminadas para que a nossa gente não viva em barracas e um clube ainda está sendo construído. Temos outro projeto em andamento para os escritórios para impedir que fiquemos presos sempre em um trailer. Em qualquer dia, qualquer hora, haverá mais que quatrocentos humanos por aqui. Justice quer que eu Laurann Dohnner Slade
131 | P R T
pare tudo por aqui para que os trabalhos sejam interrompidos até que a ameaça acabe? Ele vem me pressionando para completar logo todas as obras.
— Não. — Começou Harley. — Ele só quer colocá-la em um lugar seguro onde humanos não podem entrar. Moon e eu revisamos as plantas e acreditamos que podemos escondê-la dentro do centro da zona selvagem. Nenhum humano ousaria ir até lá e a entrada deles naquela área é proibida. Eu sei que alguns dos nossos já foram relocados e isso torna tudo melhor já que nenhuma pessoa inteiramente humana passaria por eles.
— Isso não seria seguro para ela. Ela é completamente humana.
A raiva de Slade parecia aumentar.
— Com certeza nenhum humano seria estúpido o bastante para se aventurar por lá e sobreviver, mas isso seria como usá-la de isca. Acho que eles atacariam se a levassem até o território deles. Eles são muito instáveis. Assim que os relocamos, eles começaram a marcar o território e eles vêm sendo vigilantes em não deixar que nenhum humano o invada.
— Nós vamos protegê-la — prometeu Brass, sua voz firme. — Eles não vão atacá-la.
— Eles são loucos — rosnou Slade. — Alguns nunca irão se acalmar e eles odeiam humanos a um nível que vai além do que possa imaginar. Eles surtam só de sentir o cheiro de um. — Ele apontou para Trisha. — Ela está acostumada conosco, mas não com os fracassos. Não acha que vão matá-la de medo?
— Que fracassos? — Trisha olhou para os homens.
Slade a olhou com raiva.
— Nós parecemos quase humanos, mas nem todos dos nossos tiveram essa sorte. Alguns se parecem mais com animais. Temos uma meia dúzia que sobreviveu. Alguns dos nossos foram torturados até enlouquecerem ou ficarem com um ódio pelos humanos a ponto de matar um só de vê-lo. São esses que relocamos para cá. Não vai ficar segura dentro da zona selvagem. É onde colocamos os mais antissociais deles.
Brass se abaixou e colocou Trisha de pé quando ela indicou que era isso que queria. Ele segurou sua cintura até que conseguisse se equilibrar nas pernas que tremiam. Ele se afastou um pouco quando teve certeza que não cairia. Levantou o olhar para ele.
— O que você acha?
— Acho que a zona selvagem é o melhor. Eles não vão te machucar. Depois que fomos libertos, eles usaram fêmeas para ajudar a tratar dos Novas Espécies já que não a atacamos. Tenho certeza que isso também vale para os mais selvagens. Ficaremos com você e eles vão ficar na deles. Não podemos nos esconder mais do que isso, Trisha. Seria esperto colocá-la no centro do território já que eles o reclamaram. Eles são altamente protetores de seus domínios. Ajudarão a manter todos afastados.
— Maldição — rosnou Slade. — Eu controlo isso aqui, não você. Não vou permitir que ela entre, já que sei do que estou falando e você não. Fui eu quem passou tempo com eles. Eu sei que ela não ficará segura. Vamos colocá-la no hotel quando o último andar estiver terminado. Fecharemos todo o acesso e a deixaremos lá.
— Não. — Brass cruzou os braços. — Justice me colocou no comando quanto à segurança dela. Eu posso e vou passar por cima da sua autoridade nisso. Sem ofensa, mas eu quero onde Laurann Dohnner Slade
132 | P R T
nenhum humano possa chegar até ela, Slade. E se um desses imbecis terroristas decidir se passar como trabalhador e atear fogo no hotel? Nada pode acontecer a ela. A zona selvagem é a resposta. Há casas por lá? Estou ciente que temos alguns trailers por aqui e podíamos aceitar um. Seria apertado, mas funcionaria. Temos que mantê-la longe de qualquer um que não seja Nova Espécie.
Slade estava furioso. Ele abriu os lábios e mostrou os dentes afiados quando um rugido grosso ressoou de dentro dele.
— Ok. Podem ficar com a minha casa. Só tem três aposentos, mas tenho certeza que vão se virar. Fica longe de todos os outros prédios.
Slade praguejou e rosnou de novo. Seu olhar se prendeu ao de Trisha.
— Diga a ele que não. Escute-me. Aqueles homens lá não são estáveis e você é uma fêmea completamente humana. Além disso, é médica, duas coisas pelas quais vão querer te matar só pelo fato de existir. Você vai morrer se concordar com eles a levarem para lá. Os selvagens foram tratados por fêmeas quando fomos libertos, mas depois foram levados para lugares remotos sem a presença delas. Eles passaram meses sozinhos e não estou certo se eles ainda resistiriam a atacar uma mulher. Também não estou disposto a arriscar isso.
O medo subiu pela espinha de Trisha ao fitar Slade.
— Confie em mim, Trisha. Eu nunca a decepcionaria — prometeu Brass baixinho. — Eu sei o que estou fazendo. A zona selvagem é o lugar mais seguro para você ficar. Eles não vão te machucar e eu jamais permitiria que qualquer coisa que te fizesse mal acontecesse.
— Trisha? — Slade sacudiu a cabeça para ela, observando-a de perto. — Confie em mim. Diga para eles a instalarem na minha casa enquanto eu me mudo para o hotel.
Ela conseguiu evitar ume estremecimento. Podia ficar em sua casa, mas ele sairia dela.
— Brass? — Ela virou a cabeça e tirou os olhos de Slade. — Eu sei que você vai me proteger. O que achar melhor, para mim tudo bem. Você decide.
Brass sorriu.
— Vamos para a zona selvagem.
Slade rosnou com vontade e disse um palavrão.
— Trisha? Venha aqui agora. Vamos ter uma conversinha particular.
Ela ficou tensa e o encarou lentamente.
— Como é? Você sabia há semanas como me contatar se queria conversar comigo. Devia ter tentado me dizer bem antes se existe alguma coisa a dizer que eu precisava escutar. — Ela começou a caminhar em direção ao Jipe. Ouviu alguém rosnar e se virou em tempo de ver Brass se mover rapidamente quando Slade foi para cima dela. Brass ficou entre os dois e rosnou de volta para Slade. Slade parou. Os dois ficaram tensos enquanto se olhavam. Parecia que iam brigar a qualquer momento.
— Brass? Eu não me sinto muito bem mesmo — disse Trisha às pressas, não querendo que os dois partissem para a agressão. — Podemos ir? Obrigada pela sua preocupação, Sr. Slade, mas eu tenho total confiança em Brass, Moon e Harley para me protegerem.
— Então é assim — rosnou Slade. — Ótimo. Há uma cabana vazia naquela área. Podem ficar com ela. Vou mandar alguém com suprimentos imediatamente. Só tem um quarto, mas parece Laurann Dohnner Slade
133 | P R T
que vocês quatro não se importam em dividir uma cama. — Ele virou nos calcanhares e disparou em direção a um dos prédios.
Trisha o observou ir embora e lutou contra as lágrimas.
— Ele acabou de me chamar de vadia indiretamente?
Moon riu e mexeu as sobrancelhas.
— Eu queria que você fosse. Estaria disposto a dividir com eles se conseguisse ter você nua numa cama comigo.
Ela riu, sabendo que ele estava brincando. Moon sempre conseguia fazer com que se sentisse melhor.
— Continue querendo. Vocês vão ficar no chão se só tiver uma cama.
Brass relaxou e sorriu para Trisha.
— Sem problema. Você definitivamente fica com a cama. Vocês humanos fracotes nunca sobreviveriam dormir no chão duro. Nós machos não nos importamos em dormir em superfícies duras.
Harley riu.
— Fale por si mesmo. Eu amo camas então talvez pegue o turno da noite para dormir quando Trisha não estiver nela.
— Sou bom em dormir de conchinha. — Moon mexeu as sobrancelhas para Trisha de novo, fazendo-a sorrir. — Se ficar com frio basta me dizer que eu vou te aquecer. Até me comporto se não me fizer dormir no chão.
— Vou mandar que levem colchões — grunhiu Brass de forma brincalhona. — Quando vocês ficaram tão molengas?
— Quando nos dão escolha — disparou de volta Harley.
— Vamos dar o fora daqui antes que Slade volte para rosnar outra vez para você. Lidar com todos esses humanos deixou mesmo ele mal-humorado. Eu não sei o que se meteu no traseiro dele, mas espero que ele em breve faça uso de um papel higiênico.
— A gravidade com certeza vai ajudar — Moon riu baixo.
Trisha riu. Ela amava os rapazes. Tinha certeza que iria chorar depois do confronto com Slade se não fosse por eles. Brass a ajudou a entrar no Jipe enquanto Moon e Harley foram para o banco de trás. Brass sentou no do motorista. Ele olhou para o outro Jipe com um Nova Espécie aguardando com as malas. — Sabe de que cabana Slade falou?
Ele assentiu.
— Vá na frente — ofereceu ele. — Nós vamos seguir.
Harley passou o cinto de segurança para Trisha. Ela o colocou calada e lhe deu um sorriso. Ele assentiu.
— Sempre use o cinto.
— Sim, Senhor.
Trisha fitou o belo cenário ao passarem — uma grama rica, belas árvores e montes. Ela avistou um cervo próximo a algumas árvores. Era um lugar tão lindo que ela conseguiu afastar os pensamentos sobre Slade da mente. Era difícil, mas não queria irromper em lágrimas. Laurann Dohnner Slade
134 | P R T
* * * * *
Slade andava de um lado para o outro na floresta do outro lado dos prédios, escondido de todos, e sabia que não tinha levado bem nem de longe a ocasião de ver Trisha outra vez. A visão dela nos braços de outro homem quase tinha lhe provocado uma fúria de ciúmes.
Brass a tinha levado nos braços, falado como se tivesse o direito de falar por ela, e ela permitiu. Um rosnado saiu de seus lábios. Tinha sacrificado sua sanidade para ficar longe dela, ido contra seus instintos para que ficasse perto, e ela o desafiou justamente quando tinha desejado protegê-la.
Endureceu, apertou os punhos, e parou de andar em círculos. A dor rasgou seu peito ao pensar que ela não o queria mais. Devia ter dito a ela por que a evitou, mas tinha acreditado que ela o convenceria a ignorar sua própria segurança se sentisse por ele um centésimo do que o que sentia por ela. Teria enfraquecido sua resolução, olhar nos olhos dela e se ela o tocasse, teria perdido a batalha.
Um barulho leve atraiu sua atenção e virou a cabeça para ver um Espécie procurando por ele.
— O que foi?
— O arquiteto quer falar com você. Tem algo errado com os desenhos de uma das modificações que pediu para o hotel.
A raiva queimava dentro dele. O trabalho havia consumido todas as suas horas. Ele mal dormia, mas isso afastava a maior parte dos pensamentos com relação a Trisha. Precisava ficar ocupado agora mais do que nunca. Senão pularia em um Jipe, dirigiria até a cabana e… rasgaria as roupas dela e a foderia até que ela soubesse que ainda é minha.
Afastou seus pensamentos, sabendo que não podia deixar o desejo controlar suas ações.
Ela estava pálida e doente. Preocupava-se com isso. Ela precisava descansar, obviamente, mas também… maldição! Pare de pensar em tirar a roupa dela e fazer com que perceba que é o macho certo para ela. Agora não é hora.
— Slade? Está tudo bem? — O Espécie macho inclinou a cabeça, olhando para ele com preocupação.
— Tudo bem — mentiu. — Vamos. Quanto mais rápido lidarmos com esses problemas, mais rápido o trabalho acaba.
Lidaria com a doutora mais tarde depois que tivesse tempo de pensar e avaliar a situação. Ela estar na Reserva mudava totalmente as coisas. De toda forma ela corria perigo, quer estivesse com ela ou não. Tinha que se acalmar antes que decidisse o que fazer. Não seria inteligente falar com ela até que controlasse seu ciúme.
* * * * *
A cabana compacta provavelmente havia sido construída por volta dos anos setenta se Trisha tivesse que adivinhar, baseado no interior. Fez uma careta ao ver o papel de parede da pequena cozinha e o velho carpete que cobria o chão da sala. Laurann Dohnner Slade
135 | P R T
— Só está faltando uma bola de espelhos.
— Não entendi. — Harley a fitou.
— Bem-vindos aos anos setenta, senhores. Notam os acessórios verde abacate e o papel de parede laranja? Outra dica óbvia são os painéis de madeira e esse carpete peludo saiu de moda no fim da década. Mas o lugar parece ser bem construído e eu adorei aquela lareira.
— Não tem um quarto. Tem isso. — Brass apontou para uma escada.
— O quarto fica no sótão. — Trisha subiu as escadas e viu que o quarto na verdade era bem espaçoso. — É grande e, nossa, tem uma banheira ali. Que surpresa boa.
— A cama é muito pequena para caber nós quatro a não ser que façamos um montinho — declarou de repente Moon.
Trisha começou a rir. Voltou-se e sorriu para ele, vendo que os três a seguiram até em cima.
— Eu fico em cima, por favor. Assim não serei esmagada.
— Podíamos dormir como se fôssemos cachorros-quentes embalados para viagem — ofereceu Harley.
— Quando um de nós quiser se virar, podíamos gritar “virando” e fazer que nem aqueles nadadores sincronizados que se mexem ao mesmo tempo.
— Não daria certo. — Moon gargalhou. — A pessoa da beira da cama do lado para o qual virarmos acabaria de cara no chão.
— O que daria mais espaço para os outros três. — Brass piscou para Trisha. — Acho que devemos colocar Moon e Harley nas extremidades, só por precaução.
O sorriso de Moon morreu e ele levantou a cabeça. Virou-se, farejou, e quase saltou do topo da escada.
— Tem alguém por perto — alertou com um rosnado.
Brass agarrou Trisha e a colocou na cama.
— Sente. — Ele se apressou até a janela.
Harley desceu correndo a escada atrás de Moon. Trisha ouviu a porta da frente abrir. Virou-se para encarar Brass, lutando contra o medo. Ele tinha tirado a pistola do coldre em sua coxa. Abriu a cortina e ela o ouviu soltar um palavrão baixinho.
— O que foi? — sussurrou Trisha.
— Um dos residentes locais está lá fora. Merda. O que ele está fazendo aqui? Alguém devia ter me avisado que o tinham transferido. Ele deve ter sentido o seu cheiro de leve e vindo aqui para investigar. Moon está falando com ele e Harley está vigiando o andar de baixo.
Curiosa, Trisha saiu da cama e foi para trás de Brass. Sabia que ele tinha ciência de sua presença. Ele colocou a mão para trás e a depositou em seu quadril para mantê-la onde estava. Ela hesitou e deu uma olhada de lado. Ainda havia luz e ficou fácil para que avistasse o homem lá fora—ao menos era na maior parte um homem. A visão do seu cabelo e feições a chocou profundamente.
— Ele é...
— Shhh — ordenou Brass baixinho. — Ele provavelmente vai ouvir o que você disser. Eles têm uma audição melhor do que a maioria de nós. Laurann Dohnner Slade
136 | P R T
O grande homem obviamente tinha sido alterado com genes felinos e tinha uma verdadeira juba de um loiro avermelhado. Seus olhos eram que nem de gato, aparentes mesmo à distância. Tinha um corpo enorme e musculoso. Mal estava vestido, só usando uma calça de algodão e nada mais.
Seus braços e peitoral eram gigantes, como se ele tivesse passado a vida inteira malhando. Seus traços eram mais animais do que humanos com seu nariz estranho e enormes maçãs do rosto.
Moon tinha parado a uns cinco metros do homem que permanecia muito quieto no começo da floresta. Ele levantou a cabeça de repente e seu olhar estranho pareceu imediatamente localizar Trisha. Parecia que ele de alguma forma sentia sua presença.
Um rugido irrompeu da boca do cara assustador quando ele a abriu. Era um som alto e chocante para Trisha, cem por cento não humano. O corpo inteiro dele ficou tenso e ele saiu em disparada em direção a casa. Moon pulou no seu caminho e abriu os braços para impedir que ele passasse. Moon falou rapidamente com o cara — ela ouvia sua voz, mas não conseguia entender o que falava. As ações de Moon não pararam o homem nem por um segundo.
Ela observou em horror quando o grandão atacou Moon, apenas estendendo uma mão, agarrando-o pela garganta, e jogou-o de lado tão facilmente como se fosse um boneco de pano.
O filho da puta corria rápido, direto para a casa, e rapidamente desapareceu.
Um rosnado terrível soou do andar de baixo e outro rugido surgiu. Um ruído estridente soou como se uma tora de madeira tivesse se partido ao meio, seguido por uma pancada horrível. Brass se virou, agarrou Trisha pela cintura, e rapidamente a colocou no canto do aposento.
Ele colocou o corpo na frente do seu, segurou-a atrás de si e encarou a escada quando levantou o braço para apontar a arma. Trisha se encheu de terror quando ouviu o cara subir os degraus.
— Pare, Valiant. — alertou Brass em voz alta. — Moon, Harley, fiquem aí embaixo. Eu o conheço.
— Trouxe um humano para cá? — rosnou o cara assustador. — Um humano? Justice me prometeu que nenhum deles viria aqui. Ela está no meu território. Meu. Porque é você, vou lhe dar um minuto para tirá-la daqui antes que a mate, Brass.
— Acalme-se. — Brass falava baixo agora, talvez tentando acalmar o macho fora de controle. — Ela está grávida de um de nós. Agora é uma dos nossos.
— Mentira. Não podemos procriar.
Trisha virou um pouco para a esquerda para espiar o macho aterrorizador no topo da escada. Ele tinha que ter quase dois metros de altura e seu cabelo era de um ruivo dourado incrível com mechas loiras mescladas. Caía bem abaixo dos seus ombros largos. Não pôde deixar de notar o quanto ele era bonito e exótico.
Pele bronzeada e músculos fortes cobriam seu corpo quase todo exposto. Ele tinha que ser o maior Nova Espécie que já tinha visto. Seus dentes afiados apareceram quando ele retraiu os lábios para rugir para ela. Seus olhos dourados de gato se estreitaram e ele rosnou mais forte. Trisha teria caído dura no chão se fosse dada a desmaios—devido a aparência e as ações ferozes. Laurann Dohnner Slade
137 | P R T
Notou que seus dedos estavam tensos, como se fossem garras e suas unhas pareciam afiadas, como a dos animais.
— Ela está esperando um bebê Nova Espécie. — A voz de Brass ficou mais firme. — Isso a torna uma de nós. Justice a mandou para cá porque ela não está mais segura perto de humanos. Isso vai nos causar muito pesar se o mundo descobrir porque eles vão temer a ideia de procriarmos com eles. Ela foi trazida até aqui para ser protegida por nós.
— Mentira — rosnou ele.
— Verdade — rosnou Brass em retribuição. — Não me chame de mentiroso.
Valiant rugiu mais grosso dentro do peito. — Saia da frente, vou cheirá-la.
Brass não cedeu.
— Pode farejá-la se me prometer que não vai machucá-la. Ela está carregando um bebê Nova Espécie. Está só com um pouco mais de um mês de gravidez.
Valiant urrou de novo.
— Certo. Não vou machucar a mulher. Saia da frente para eu sentir o cheiro.
Brass virou a cabeça. Trisha fitou suas feições intensas. Não queria que Brass saísse de sua frente e com certeza não queria Valiant próximo a ela. Ele a matava de medo. O olhar de Brass suavizou.
— Ele só quer sentir o seu cheiro. Eu o conheço. Fomos criados na mesma unidade de testes e passamos um tempo juntos bem depois de sermos libertos antes que eles o mandassem e os outros como ele para longe dos humanos. Ele deu sua palavra, e vai mantê-la.
Trisha teve que lutar contra o pânico. Realmente confiava em Brass e ele não permitiria que a machucassem.
— Tudo bem.
Brass recuou um passo, deixando o caminho até ela livre. Ela se apoiou na parede, fitando o homem horripilantemente enorme que a encarava. Seus dentes afiados e de aparência perigosa apareceram e ele ainda parecia com raiva. O coração de Trisha martelou quando ele se aproximou, do jeito que um predador faria. Ele era um predador.
— Não a assuste, Valiant — disparou Brass. — Tudo bem, Trisha.
Ela assentiu, mas não tirou a atenção do homem que avançava lentamente em sua direção. Seus olhos eram mesmo lindos quando se aproximou mais, mas definitivamente não eram humanos. Eram olhos de gato, comparáveis talvez aos de um leão, porque ele com certeza não se parecia com nenhum gato doméstico que já tinha visto, claramente que não. Seus cílios eram de uma cor avermelhada que combinava com o seu cabelo, anormalmente longos e cheios. Ele deu outro passo. Ela endureceu, mas levantou o queixo. Tinha certeza que Brass lutaria para protegê-la se achasse que Valiant representasse uma ameaça.
Valiant de repente se abaixou com as mãos no chão. Pareceu estranho quando ele se aproximou mais, seu olhar intenso fixo no dela. Ele se aproximou tanto que podia sentir sua respiração quente pela camisa na altura do estômago.
Trisha levantou as mãos bem devagar e encostou as costas delas na parede para evitar entrar em contato com ele acidentalmente. Estava com medo de enfurecê-lo se isso acontecesse. Ele inalou quando veio mais perto e fungou seu estômago, enterrando o rosto na abertura entre Laurann Dohnner Slade
138 | P R T
sua camiseta e calça para alcançar sua pele. Ela fez um som ofegante, jamais esperando que ele fizesse aquilo.
— Vá com calma — disse Brass. — Está assustando-a e não ouse descer esse nariz.
O olhar chocado de Trisha voou para Brass. Ele deu de ombros.
— Alguns de nós… inferno, esqueça. Esteve com animais o suficiente para saber que alguns deles metem o nariz na virilha para conhecer as pessoas.
Valiant se afastou de repente e ficou de pé. O foco dele continuou em seu estômago enquanto franzia o cenho. Ele não parecia nem um pouco feliz.
— Ela tem um cheiro diferente.
— Como assim? — Brass parecia muito calmo.
— Não inteiramente humano, mas não muito parecido com o nosso. Você só nota cheirando a pele dela.
Brass hesitou antes de olhar para Trisha.
— Posso?
Trisha encolheu os ombros.
— Contanto que não fungue mais embaixo.
Ele riu.
— Você não é nada divertida, Trisha.
Seu sorriso morreu quando ele ficou na sua frente e abaixou a cabeça até colar o nariz em seu pescoço. Quando tocou sua pele inalou lentamente, então repetiu o processo. Ele levantou a cabeça, franziu o cenho, e ficou de joelhos. Ele pegou sua camiseta e a levantou um pouco para revelar sua barriga. Colocou o nariz ali e inalou três vezes até recuar e se levantar. Ele encarou Valiant.
— Você tem razão. Não dá para notar a não ser que cheire a pele da área da barriga. É bem fraco.
— Ela está mesmo grávida de um de nós? — Valiant parecia calmo agora. Sua voz estava grossa, meio que rouca, como se tivesse passado cem anos fumando ou danificando a garganta de outro modo, mas não estava mais rugindo.
— Está.
Valiant assentiu.
— Não posso acreditar que se emparelhou com uma humana. No que estava pensando? Elas são tão frágeis que eu estou surpreso por ela não ter se partido ao meio. Podia ao menos encontrar uma de tamanho normal e mais robusta. Devia mesmo se conter. Qual é o prazer de procriar se tem que se preocupar em machucar sua mulher?
Brass corou um pouco.
— O bebê não é meu. Eu nunca cruzei com ela. Sou amigo dela e sou um dos três que Justice pediu que a protegessem.
Valiant virou a cabeça em direção a Trisha e rosnou.
— Há um complexo para experimentos com reprodução? Ela se voluntariou para algum médico colocar nosso esperma dentro dela? Laurann Dohnner Slade
139 | P R T
— Não. — Brass se moveu, colocando-se entre os dois de novo. — Eles procriaram naturalmente, de livre vontade. Foi uma surpresa para todos nós ela ficar grávida. Não achávamos possível.
Valiant suspirou.
— Pode sair da frente. Não vou machucá-la.
Brass se afastou de Trisha. Ela encontrou os olhos de Valiant. Ele a fitava, mas não parecia mais com raiva. Parecia levemente confuso. Ele suspirou outra vez.
— Você pode ficar, humana. Só você. Não traga nenhum dos seus amigos humanos nem família. Eu os comeria no jantar. — Ele virou o olhar para Brass. — Vou dizer a todos na zona para evitar que outros venham incomodá-la.
— Podia nos ajudar a protegê-la? Por favor, fique de olho em qualquer humano à espreita e garanta que não se aproxime dela.
Valiant sorriu, mostrando de novo seus dentes afiados.
— Seria um erro fatal da parte deles se qualquer humano for estúpido o bastante em vir para cá.
Brass relaxou visivelmente depois de Valiant descer a escada. Ele sorriu para Trisha, mas o sorriso pareceu um pouco forçado. Moon e Harley subiram os degraus às pressas segundos depois. Harley estava sangrando e segurava um pano molhado na testa. As roupas de Moon estavam rasgadas.
— Ninguém me avisou que Valiant estava aqui. Ele é o mais cruel e o mais mortal da nossa gente. Eu teria ido vê-lo antes de trazer você aqui se soubesse. Poderíamos lidar com qualquer outro, mas ele é… — Brass encolheu os ombros. — Um filho da puta e tanto.
Trisha se mexeu agora que o terror passou. Andou até Harley.
— Abaixe a cabeça e me deixe dar uma olhada nisso. — Olhou para Moon. — Está machucado?
— Vou viver. Eu sei como uma bola de futebol se sente agora e isso para mim acabou com o esporte. — Ele se virou e desceu a escada.
Harley se abaixou um pouco e tirou o pano molhado. Trisha examinou o ferimento e praguejou baixinho.
— Não vai precisar levar pontos, mas preciso limpar e fazer um curativo nisso.
— Porra. — Ele corou. — Quer dizer, droga.
Trisha riu.
— Fique à vontade. Eu teria dito coisa pior se alguém fizesse isso comigo. Ele bateu em você com o que?
— Com a porta. — Ele fixou o olhar em Brass. — Vai querer ligar e pedir uma nova. Valiant a arrancou das dobradiças e jogou em cima de mim. Eu tentei me desviar, mas a ponta da coisa bateu na minha testa. A mesa de café também não sobreviveu. O lado positivo é que não precisamos mais cortar madeira se Trisha quiser acender o fogo esta noite. Podemos usar os cinquenta pedaços da mesa que estão pelo chão.
Brass suspirou. Laurann Dohnner Slade
140 | P R T
— Vou pedir um kit de primeiros-socorros para que Trisha possa fazer o curativo no seu dodói, Harley. Importa-se Trisha? Ainda não temos um médico na Reserva.
— Só me arrume o que eu preciso. Precisa que eu lhe dê uma lista de suprimentos?
— Não. — Brass não parecia feliz. — Tenho certeza que o que temos dentro dos nossos kits vai te ajudar em tudo o que possivelmente vá precisar. Acho que vou descer para avaliar os danos e depois, ligo para o escritório e os informo do que precisamos.
— Obrigada. — Trisha sorriu para ele. — Por tudo.
— Ei — grunhiu Harley. — Eu levei uma portada na cabeça. Onde está o meu “obrigada”?
Trisha riu e estendeu a mão para tocar o braço de Harley.
— Obrigada.
— Ela me tocou. — Harley estirou a língua para Brass, provocando-o, e fez Trisha rir.
— Não tem algo a fazer? — Eles podiam ser infantis, mas ela apreciava suas tendências brincalhonas.
— Estou indo. — Brass desceu a escada. Foi resmungando o caminho inteiro.
Trisha fez Harley sentar na cama.
— O que ele disse?
Harley sorriu.
— Algo sobre ter que passar vergonha quando ligar e Slade descobrir que já houve problemas assim que chegamos.
Trisha entrou no pequeno banheiro e pegou uma toalha de rosto. Voltou ao quarto para aplicar uma nova compressa na cabeça ensanguentada de Harley. Brass não era o único que temia como Slade reagiria quando descobrisse que já tinha ocorrido um incidente na cabana. Laurann Dohnner Slade
141 | P R T
Nenhum comentário:
Postar um comentário